Entrevistamos a ex-secretária de Educação Básica do MEC, Katia Smole, para explicar o que é a Base Nacional Comum Curricular (BNCC) e saber como os pais podem contribuir nesse contexto de reformulação dos currículos escolares.
Katia Smole também é doutora em Educação pela USP e, atualmente, é membro do Conselho Estadual de Educação de São Paulo e diretora do Grupo Mathema, que é especializado em ensino de Matemática na Educação Básica.
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ME: Por que foi definida uma Base Nacional Comum Curricular?
Katia Smole: A Base Nacional Comum Curricular estava prevista desde a constituição de 1988, portanto ela é um documento normativo, ou seja, vale para todo o território nacional, para todos os tipos de escolas, tanto públicas como particulares.
A BNCC é uma orientação clara sobre o que os alunos devem aprender do Infantil ao Ensino Médio, em todas as etapas de ensino, ano a ano, em todas as disciplinas.
Ela orienta os currículos escolares, a produção dos materiais didáticos, sejam eles livros ou apostilas, e também orienta a formação dos professores. Então é um documento abrangente que visa garantir que o país avance de forma significativa em relação à formação dos seus alunos.
ME: Com a BNCC, de que modo os conteúdos regionais podem ser trabalhados em sala de aula?
Katia Smole: Eles serão trabalhados pela escola. A Base trabalha o essencial para que todos tenham o mesmo aprendizado, independente do tipo de escola ou da região.
Além disso, as escolas fazem a própria organização, então elas têm a liberdade de acrescentar temas. Elas não podem fazer menos do que está previsto no documento, mas podem fazer mais.
O regional é uma especificidade de cada comunidade e pode ser decidido pela própria escola. Por exemplo, um colégio do Mato Grosso pode trabalhar mais a cultura indígena ou a escola pode abordar a formação do próprio estado.
Os conteúdos podem ser acrescentados, está na autonomia da escola fazer isso. O que não pode é deixar que crianças e jovens avancem pelos anos escolares sem saber coisas essenciais, como ainda acontece no Brasil.
ME: Qual é a importância da BNCC para a vida escolar da criança?
Katia Smole: Ela vai garantir várias coisas, por exemplo, no caso de um aluno que está no 3º ano do fundamental e mora em São Paulo, mas se muda para o Rio Grande do Sul. Esse aluno terá garantido um conjunto de aprendizados, independente da escola e do livro utilizado.
Outro ponto importante é a progressão de aprendizagem, isto é, no ano escolar corrente o aluno deve aprender mais do que no anterior e menos do que no ano posterior. Hoje, nem todos têm uma clareza sobre o que o aluno deve aprender naquela série.
Para os pais, por exemplo, eles podem acessar a Base e entender os focos principais que a escola precisa seguir e quais são os aprendizados essenciais que o filho terá naquele ano. A Base decidiu isso em todo o território nacional.
Outros países do mundo já tem isso definido. Então a BNCC coloca o Brasil em outro patamar rumo a uma educação de qualidade.
ME: Como os pais, ou os responsáveis, podem verificar se a escola está seguindo as diretrizes da BNCC?
Katia Smole: Os pais precisam entender que estamos em um processo de implementação. A Base terminou de ser aprovada em 2018 e ela ainda está em processo de organização curricular, então ainda há ajustes dos materiais e dos processos pedagógicos a serem feitos. Não se trata dos pais pegarem o texto e fazer um checklist, mas de estabelecer um diálogo com a escola.
Como está sendo a formação dos professores que ensinam nessas escola em relação a BNCC? O que fizeram com o projeto pedagógico? O material está de acordo? Fazer perguntas a respeito. Se eu fosse a escola, chamaria os pais e explicaria o que é a Base, como ela será implementada pela escola e como estou agindo. É um movimento dos dois lados, da família e da escola.
ME: Caso a escola ainda não tenha se adaptado a BNCC, como os pais devem proceder?
Katia Smole: A escola tem que ter um plano. Existe um calendário de implementação que é nacional e vale para todas as escolas. Claro, algumas podem ter um tempo maior, mas precisam pelo menos mostrar quais são os próximos passos e dizer em qual etapa está.
É importante que a escola mostre para as famílias o processo que ela está desenvolvendo. Ainda tem um tempo bacana para que isso seja feito.
Um diálogo no sentido de parceria é a melhor coisa que pode acontecer, assim a escola e a família trabalham juntas. Até porque o resultado final é um só, crianças aprendendo e felizes. Não se trata de cobrar, mas de se informar, de saber qual é a parceria possível e quais são os próximos passos.
Às vezes, os pais podem podem pedir um encontro para que eles também entendam a BNCC. O Mathema tem feito isso, incluído a conversa com as famílias como uma orientação para a escola.
ME: Em relação às avaliações escolares, quais são as principais mudanças previstas pela BNCC?
Katia Smole: Nas avaliações, há dois tipos de mudança. Uma nas grandes avaliações, que são as nacionais, feitas pelo MEC, que serão adequadas à nova Base.
No caso específico da que os professores fazem em sala de aula, a Base traz a ideia de desenvolver a pessoa, não só no sentido de que ela aprenda conteúdos importantes, mas também para que ela seja mais empática e tenha a capacidade de gerir os próprios projetos.
O esperado é que as escolas e os professores estejam pensando em novos sistemas e formatos de avaliação. Por isso, volta na história de como a escola está se organizando. É necessário ajustar os currículos, os materiais, a formação dos professores e também as avaliações.
Se os pais quiserem entender mais, vale muito a pena entrar no site do Mathema, que contém informações sobre a BNCC. Outro site muito bom é o movimentopelabase.org.br, que é atualizado e possui vídeos informativos. As escolas e as famílias podem usar essas referências para ampliar esse movimento sobre a educação que está sendo feito.
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Quer saber mais sobre a BNCC?
O documento começou a ser elaborado em 2015 e foi aprovado em 2019. Participaram da sua elaboração professores, pedagogos, diretores de escolas e outros profissionais da educação, além de ter existido uma consulta pública de seis meses sobre o seu conteúdo.
Para te deixar por dentro do assunto, listamos e respondemos cinco dúvidas frequentes sobre a BNCC, confira:
1. Para que serve a BNCC?
A BNCC dispõe de orientações não apenas sobre os conteúdos a serem ensinados em cada ano letivo, mas também sobre a formação de professores, a elaboração de materiais didáticos e as avaliações.
Desse modo, a BNCC contempla diversas dimensões do processo de ensino e aprendizado, o que diminui a desigualdade de aprendizado e contribui para efetivar o direito à educação já previsto na Constituição.
2. A BNCC substitui os currículos existentes?
Não. A BNCC não é um currículo, então ela não substitui os que já existem. O documento, como o próprio nome sugere, serve como base para que as escolas possam montar os próprios currículos.
A BNCC aponta habilidades e competências essenciais para serem desenvolvidas na educação básica. Já o currículo é um planejamento sobre o que será ensinado em sala de aula e quais são os objetivos de aprendizado esperados.
3. A BNCC é a mesma para todas as regiões do Brasil?
O documento é o mesmo para todo o território nacional. Mas ele estabelece um currículo mínimo, então as secretarias estaduais de Educação podem incluir conteúdos que considerarem importantes para a própria região.
Além disso, a BNCC define o que ensinar, mas não como ensinar. Assim, cada escola pode trabalhar as diferenças regionais dentro do próprio Plano Político Pedagógico (PPP), incorporando a diversidade local no currículo.
4.Quais são as competências trabalhadas na BNCC?
A Base Comum Curricular definiu dez competências para garantir o conjunto de aprendizado considerado essencial durante a educação básica. São elas:
- Conhecimento;
- Pensamento científico, crítico e criativo;
- Repertório cultural;
- Comunicação;
- Cultura digital;
- Trabalho e projeto de vida;
- Argumentação;
- Autoconhecimento e autocuidado;
- Empatia e cooperação;
- Responsabilidade e cidadania.
5. Como as competências são trabalhadas em sala de aula?
De acordo com a BNCC, essas dez competências devem ser desenvolvidas e aprimoradas ao longo da vida escolar do aluno. Então, elas precisam ser integradas com as disciplinas.
Por exemplo, a competência “Empatia e cooperação” pode ser trabalhada por meio de projetos colaborativos, no quais os alunos se deparam com dificuldades, opiniões diferentes e precisam exercitar a compreensão e o diálogo para ter sucesso.
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